O estudo de determinado período precisa abarcar a dimensão das mentalidades, ou seja, uma análise a respeito da cultura e visão de mundo daqueles agentes históricos. Nesse sentido, para se estudar qualquer sociedade, é necessário uma reflexão a respeito de como aqueles indivíduos encaram a vida e a morte. Por isso, o aspecto religião é fundamental para a determinação dessa dimensão e, no caso, quando falamos de História do Brasil, precisamos levar em consideração o fator sincretismos religiosos.
Além de ser fundamental para compreender a mentalidade social, a questão do sincretismo é muito prezada por vestibulares, principalmente o ENEM. Nesse sentido, primeiramente, precisamos entender que a coexistência de elementos e crenças diversas têm como principal palco e atores o cotidiano popular.
As vivências de setores populares na história do Brasil foram os principais agente de fusão de crenças. O catolicismo ibérico que aporta em terras americanas na experiência colonial já é uma religião sincrética em si. A figura dos santos durante a Idade Média marcou um processo de ressignificação de práticas tidas como “pagãs’ e inserção destas ao seio da Cristandade.
Esse denominado “encontro colonial” entre nativos e portugueses foi encarado durante muito tempo pela historiografia como um processo de via única de imposição cultural e de força, ou seja, os colonizadores impondo aos indígenas a fé católica e o cativeiro. No entanto, as dinâmicas religiosas nos ajudam a entender melhor como que este foi um processo de transformação cultural mútua, sem ignorar o quesito violência da experiência colonial.
As crenças religiosas católicas, em contato com os nativos, sofreu diversas transformações na vivência popular e vice e versa. Hoje em dia, sabemos que a crença do povo tupi a respeito da busca de uma Terra Sem Males – por exemplo – adotou diversos signos católicos de visão de morte.
Com o tráfico de almas negras massivo e constante a partir da institucionalização da colonização, a crença religiosa de escravizados, advindos principalmente do tronco banto africano, também se enquadrou nesse contexto religioso. A partir do século XIX, com o apogeu do tráfico, principalmente, já conseguimos ver, em fontes, menções claras a cultos a divindades africanas.
A crença aos Orixás não necessariamente se deu em uma dinâmica alheia à vida religiosa brasileira. A ressignificação de santos católicos tornou-se um dos principais meios de culto banto, principalmente a partir do ingresso em Irmandades religiosas, como Irmandade da Boa Morte e Irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos.
Ademais, dois conceitos são muito importantes para entendermos esses processos de sincretismo religioso: ressiginificação e agregação de signos religiosos. Essas duas noções andam juntas, pois o processo sincrético é um meio agregador que gera um novo significado àqueles signos sagrados. Essa fusão de elementos e crenças, no entanto, não deve ser analisada como um processo cordial e amigável, ou seja, não exclui o perfil violento da imposição e proibição à cultos afro-aborígenes.
As heranças desses sincretismos religiosos geram o que hoje em dia vivenciamos na síntese de uma crença popular, que mistura e ressignifica cotidianamente, inconscientemente na maioria das vezes, o meio divino nessa visão de mundo. No entanto, estamos muito longe de um democracia religiosa no país, convivendo dia a dia com atos de intolerância, principalmente ataques a religiões afrobrasileiras.