Nomear contextos não é uma tarefa fácil, até porque qualquer erro ou precipitação, pode levar a consequências catastróficas. Não foi diferente com a COVID-19, que passou por todo um processo de pesquisa e entendimento até ganhar um termo apropriado e ser nomeada como uma pandemia.
Segundo a OMS, uma pandemia é a disseminação mundial de uma nova doença. Uma epidemia que atinge grandes proporções, podendo se espalhar por um ou mais continentes, ou por todo o mundo, causando diversas mortes. Além disso, para ser considerada uma pandemia, deve ser infecciosa. Exemplos: AIDS, Tuberculose e Covid-19.
Entretanto, muitos cientistas começaram a defender a ideia de que a Covid-19 não é uma pandemia. Foi publicado recentemente na The Lancet, revista científica extremamente prestigiada na área de medicina, um artigo alegando que a Covid-19 é na verdade uma sindemia, e que isso deve ser entendido para combater de maneira efetiva o vírus.
Mas, o que seria uma sindemia?
O nome sindemia é um neologismo que combina os conceitos de sinergia (termo utilizado na medicina para descrever cooperação) e pandemia. O termo foi introduzido pelo antropólogo médico americano Merrill Singer na década de 1990, com o intuito de explicar uma situação em que “duas ou mais doenças interagem de tal forma que causam danos maiores do que a mera soma dessas duas doenças”. Singer explicou em entrevista à BBC News Mundo que: “O impacto dessa interação também é facilitado pelas condições sociais e ambientais que, de alguma forma, aproximam essas duas doenças ou tornam a população mais vulnerável ao seu impacto”.
Sindemias são caracterizadas por interações biológicas e sociais entre diferentes condições, que aumentam a vulnerabilidade de uma pessoa a uma determinada doença, ou seja, é quando um problema de saúde e o contexto socioeconômico interagem agravando o panorama.
A interação com o aspecto social é o que faz com que não seja apenas uma comorbidade, conceito que se refere a um contexto em que duas ou mais doenças estão etiologicamente relacionadas.
Isso é exatamente o que estamos vendo ocorrer com a COVID-19. Os dados disponíveis mostram que as pessoas com mais chances de ficarem gravemente doentes ou morrer são também aquelas que já sofrem com outras enfermidades como câncer, diabetes, problemas cardíacos ou mesmo obesidade. Também tem sido observado que a doença ataca desproporcionalmente as comunidade desfavorecidas, de baixa renda e de minorias étnicas. Nos Estados Unidos, por exemplo, uma pessoa negra tem o dobro de chance de morrer por Covid-19, segundo o Centro de Controle de Doenças (CDC).
Além disso, doenças como diabetes ou obesidades (condições pré-existentes que são fatores de risco para a covid-19) são mais comuns em indivíduos de baixa renda.
O que isso muda?
Isso tudo nos mostra que não se trata apenas de um diferente termo. Entender a crise de saúde, o panorama verdadeiro que vivemos e enfrentamos, nos ajuda a encontrar uma solução mais adequada.
Richard Horton, editor do Lancet, abordou isso no artigo “COVID-19 is not a pandemic” e disse: “Não importa quão eficaz seja um tratamento ou quão protetora seja uma vacina, a busca por uma solução puramente biomédica contra a COVID-19 vai falhar”. Ele conclui que: “A menos que os governos elaborem políticas e programas para reverter profundas disparidades sociais, nossas sociedades nunca estarão verdadeiramente protegidas da COVID-19”.
Dessa forma, as condições sociais que agravam o panorama da COVID-19 não podem ser ignoradas, pedindo a atenção das autoridades.
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